segunda-feira, 23 de junho de 2008

Além do que não se vê


Eu parei e olhei para o ar. Só isso: parei e olhei. Não vi nada. Mas sabia que havia algo ali. Muitas coisas, por sinal... Coisas pequenas... mínimas, na verdade. E achei curioso me ver flutuando por aqui e por ali, vi-me repousando nuns móveis velhos, em alguns novos. E até ri porque era engraçado ter isso na minha cabeça. A onipresença de algo tão material quanto eu era impossível e irremediavelmente patética.
Me vi no ar porque o que havia lá era igual a mim. Não igual em seu todo, certo. Mas parecia muito comigo. Parecia bem mais do que alguém que esbarrou em mim hoje cedo ou do que alguém que possa vir a ler o que minhas mãos toscamente sugerem... Ah! E não se parecem pelo fato de serem ínfimos ou invisíveis... isso é óbvio demais (é, na verdade uma das poucas coisas que me tornam parecidos com você, ou com uma pedra... ou com a poeira que estava no ar junta aos micro-organismos – macros de complexidade – que eu estivera olhando, mesmo sem ver, porque são interessantes)...
[...]
Ahh... que bom que a grandeza é definitivamente relativa (ao ponto de o lugar mais alto do meu pódio ser enfadonho, distante, ou típico para algumas pessoas que não me interessam muito)! E voltando àquilo que eu tentava ver no ar, eles não eram iguais a mim pela grandeza. Tampouco pelo tamanho, claro. Eu sei porque eles eram iguais a mim... Que besteira! Todo mundo sabe, mas se negam ao conhecimento trivial (ou temem: outra vez um abraço do orgulho).
Talvez a poeira e os micro-organismos que não aceitam ser iguais a mim. Na verdade, na medida do impossível, devem ter vergonha dessa semelhança toda. Sim... vergonha de se parecerem com algo que possui a insensata modéstia de se julgar racional, vergonha da unilateralidade disso que nós somos. Nós pisamos num único plano. Não flutuamos como eles. E eles nem sequer têm asas.
O que há no ar sempre houve e sempre haverá. Sempre nos observaram e sempre nos observarão (enquanto estivermos por aqui). Não os observamos não somente por não conseguimos vê-los, mas por prejulgá-los.


3 comentários:

Isolda disse...

Viajei total com esse texto...
Adorei mesmo!

Anônimo disse...

Sabe Hercules, lendo seu blog me deparei com uma curiosa observação (intrísceca!): seu estilo lembra muito o da Clarice Lispector.
E como adoro a Clarice, também adoro as suas divagações filosóficas que se fazem ouvir através de tantas e ricas palavras.
Parabéns aee

Lucrécio Arrais disse...

Curto muito.